Elon Musk defende que algoritmo do Twitter se torne público
Mecanismo é responsável por definir os conteúdos apresentados aos usuários na rede social
No dia 24 de março, semanas antes de fazer a oferta para comprar o Twitter, Elon Musk postou uma pesquisa na rede social: “o algoritmo do Twitter deveria ser de código aberto?”, escreveu, com opções para os usuários votarem “sim” ou “não”.
Algumas das tecnologias do Twitter já são de código aberto, o que significa que estão publicamente disponíveis para qualquer pessoa visualizar, retrabalhar e usar para outros fins.
Mas o que Musk estava perguntando, essencialmente, era se as regras que os computadores seguem para definir o que você vê no seu feed do Twitter também deveriam ser públicas. Mais de um milhão de votos foram contabilizados quando a votação foi encerrada, com uma quantidade esmagadora de votos a favor (82,7%).
As implicações da sugestão e da pesquisa de Musk ganharam novo peso na semana passada, após o CEO da Tesla e da SpaceX anunciar que fez uma oferta para comprar todas as ações do Twitter que ainda não possui, em um negócio que valorizaria a empresa em cerca de US$ 41 bilhões (cerca de R$ 193 bilhões). No último dia 15, o conselho do Twitter anunciou uma medida chamada “pílula de veneno”, que poderia dificultar a aquisição da empresa por Musk.
Se o acordo for concluído, Musk disse que seu objetivo é “desbloquear” o “potencial extraordinário” do Twitter, mas suas sugestões de mudanças específicas sobre como fazer isso são um tanto quanto vagas. Um dos principais focos de Musk tem sido reforçar a liberdade de expressão na plataforma, e sua sugestão para os algoritmos é parte central desse esforço.
Horas após Musk fazer sua oferta para comprar o Twitter, o bilionário repetiu a ideia de abrir os códigos dos algoritmos do Twitter durante sua participação na conferência TED, em Vancouver, no Canadá.
Ele também disse que deveria ficar mais claro para os usuários quando são tomadas quaisquer ações pelo Twitter que afetam o que você tuíta –como decisões para amplificar ou restringir tuítes.
Dessa forma, ele explicou no evento TED, “não há nenhum tipo de manipulação nos bastidores, seja de forma algorítmica ou manual”. Membros da plateia reagiram com aplausos entusiasmados. O Twitter coloca rótulos nos tuítes por uma série de razões, quando um post contém informações enganosas ou se viola as regras da rede social, por exemplo, mas ele fica disponível depois de ter sido definido como “de interesse do público”.
Musk não está sozinho em seu apelo para que as plataformas de tecnologia sejam mais transparentes com seus algoritmos. Na esteira da divulgação dos Facebook Papers em 2021, que demonstrou como os algoritmos podem alimentar a divisão e levar usuários a caminhos perigosos, houve uma maior investigação sobre os algoritmos que cada vez mais dominam nossas vidas.
Além disso, o cofundador e ex-CEO do Twitter, Jack Dorsey, pediu para que mais seja feito para dar aos usuários mais controle na rede social, respondendo à pesquisa de Musk e retuitando com um comentário seu: “a escolha de qual algoritmo usar [ou não] deve ser aberta a todos”.
Musk também está certo em apontar para os algoritmos que sustentam a empresa como uma parte essencial do que faz do Twitter, bem, o Twitter. Afinal, os algoritmos, que são no seu formato mais simples um conjunto de instruções, formam a base para inúmeros produtos e serviços que dependem de computadores.
Eles são usados para definir quais tuítes você vê das pessoas que segue na plataforma, ou para mostrar tuítes que o Twitter acha que você iria gostar com base em diversos fatores como as contas com as quais você interage, a popularidade de um tuíte, ou como outras pessoas que você conhece estão interagindo com um post.
Eles também são utilizados para recortar imagens que são postadas e para remover conteúdos de propagação de ódio. E se você optar por ver tuítes na ordem de postagem mais recente, isso também usa um algoritmo.
No entanto, tornar públicos os algoritmos que moldam o que você vê no Twitter não ajudará muito a tornar a empresa mais transparente, de acordo com especialistas em inteligência artificial e software de código aberto.
Mesmo que isso ajude a lidar com algumas desconfianças dos críticos quanto às ações de controle de conteúdo do Twitter, avançar nessa direção também pode criar um novo conjunto de riscos para a rede social.
Musk não respondeu a um pedido de comentário do CNN Business, e o Twitter se recusou a comentar.
As limitações do plano de Musk
Mesmo aqueles que conseguem entender o código de um algoritmo não necessariamente entendem como ele funciona. Pense, por exemplo, como muitas vezes há apenas uma explicação básica das empresas de tecnologia sobre como seus sistemas algorítmicos funcionam e para que são usados.
As pessoas que constroem esses sistemas nem sempre sabem por que chegam a algumas conclusões, e é por isso que são comumente chamadas de “caixas pretas”.
Permitir que qualquer pessoa veja o código do site é “um pouco sem sentido”, disse Vladimir Filkov, professor de ciência da computação da Universidade da Califórnia, Davis, porque poucas pessoas conseguem entender como a base de código do Twitter funciona para produzir o que veem nas telas.
“Abrir o código, por definição, significa que você pode ver o código, mas isso não significa que você vai entender ou influenciar as políticas que levam a esse código”, explicou Filkov, que cria ferramentas para ajudar desenvolvedores a executar projetos de software de código aberto mais eficazes.
Dito isso, aqueles que conseguem entender seriam capazes de descobrir como o Twitter decide quais tuítes mostrar aos usuários, afirmou Ariel Procaccia, professor de ciência da computação da Universidade de Harvard, cujos estudos incluem inteligência artificial e economia.
“Nessas circunstâncias, é melhor a empresa garantir que seus algoritmos sejam justos, pois certamente seria responsabilizada se não fossem”, disse Procaccia. “Creio que isso seria um retorno positivo para os usuários”.
Filkov acredita que seria útil pegar uma página do que outros projetos de código aberto costumam fazer com seus códigos: listar publicamente as políticas que levam a esses códigos.
“Compreender essas políticas seria mais fácil do que entender o código”, afirmou.
Um novo conjunto de riscos para o Twitter
Além da efetividade de abrir os algoritmos do Twitter, há também a questão do que, exatamente, seria divulgado ao público junto com o código.
Por exemplo: se o Twitter abrisse apenas um algoritmo de aprendizado de máquina que usa para decidir o que é permitido ou não na plataforma, mas não os dados de treinamento usados para informar esse algoritmo, isso seria “bastante sem sentido”, disse Allison Randal, membro do conselho da Software Freedom Conservancy e da Open Infrastructure Foundation.
Porém, tudo fica mais complicado se os dados de treinamento forem considerados. Se esses dados de treinamento incluírem tuítes privados, divulgá-los levaria a “enormes implicações negativas para a privacidade”, alertou.
No entanto, tornar os algoritmos do Twitter públicos não levaria necessariamente a alguma alteração na plataforma. Os usuários não poderiam fazer nenhuma mudança no código que gerencia a rede social, a menos que o Twitter habilitasse tais ações (por exemplo, implantando uma alteração para todos os usuários, ou permitindo que usuários individuais mexessem no código que controla suas contas pessoais).
“É claro que os usuários poderiam copiar o código e modificá-lo, mas tais alterações não afetariam os algoritmos implantados no próprio Twitter”, disse Procaccia. “É bastante improvável que o Twitter considere implantar mudanças feitas por não funcionários”.
Embora tornar seus algoritmos disponíveis publicamente possa aumentar a confiança entre os usuários, isso também pode dar uma vantagem aos concorrentes do Twitter. Como Procaccia observou, os concorrentes poderiam copiar e implementar os algoritmos da rede social.
Isso também deve ser feito com cuidado para evitar violações de segurança, disse Filkov.
Ele acredita que a liberação pública do código precisaria ser acompanhada por um esforço para garantir que a base do código seja mais segura.
“Compreender o código significa entender as falhas no código também”, acrescentou. “Assim, alguém que tem más intenções pode certamente tirar proveito do conhecimento do código e expor a plataforma a riscos, o que pode incluir o sequestro de contas ou a exposição da plataforma a informações enganosas”.
Por CNN Brasil