Lula recebe governadores para discutir crise na segurança pública e apresentar PEC

Proposta do Executivo pretende ampliar competência da PF, sobretudo em ações contra milícias; PRF também ganharia novas atividades

Lula recebe governadores para discutir crise na segurança pública e apresentar PEC
Foto: Divulgação

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu chamar os governadores de todo o país para discutir a segurança pública e a recente onda de crimes pelo país nesta quinta-feira (31), no Palácio do Planalto, em Brasília. Entre os temas que devem ser analisados pelas autoridades, está a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Segurança Pública, elaborada pelo Ministério da Justiça. A matéria pretende ampliar a atuação federal na segurança dos estados.

O governo Lula quer um modelo de polícia ostensiva, com atuação em todo o país. Nesse sentido, o texto pretende ampliar a competência da Polícia Federal, sobretudo em ações contra milícias, crimes ambientais e narcotráfico. Além disso, a PEC quer alargar as atividades feitas pela Polícia Rodoviária Federal, com fiscalização em hidrovias e ferrovias, por exemplo.

No último dia 17, Lula afirmou que deve enviar a PEC ao Congresso Nacional até o fim deste ano. O presidente argumentou que a competência da União no tema é basicamente o repasse de recursos aos estados e municípios e defendeu uma coordenação nacional na área. A declaração foi dada em uma entrevista a uma rádio de Salvador (BA).

“Eu não quero que seja apresentada como proposta dele [o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski]. Eu quero reunir os 27 governadores para criar uma política de segurança pública que envolva a cidade, o estado e a União. Qual o papel de cada um nisso? Os estados não abrem mão do controle da polícia, e a Polícia Federal não pode entrar nisso, só quando o estado pede. Então a nossa contribuição termina sendo a de repassar dinheiro, e nós não queremos isso”, disse Lula.

Crimes

Para além da PEC da segurança pública, Lula quer debater com os governadores saídas práticas para os crimes registrados no país, sobretudo em função de episódios recentes. Um deles ocorreu em Novo Hamburgo (RS), em 22 de outubro, quando Édson Fernando Crippa, de 45 anos, manteve a família em cárcere privado por mais de 10 horas, trocou tiros com a polícia e matou o pai, o irmão e o policial militar Everton Kirsch Júnior. O atirador também morreu. Pelas redes sociais, o presidente lamentou a tragédia e criticou a política de liberação de armas para a sociedade civil.

“O trágico episódio ocorreu após denúncias de maus-tratos contra um casal de idosos na casa do atirador, que possuía quatro armas registradas em seu nome. Isso não pode ser normalizado: a distribuição indiscriminada de armamentos na sociedade, com grande parte deles caindo nas mãos do crime, é inaceitável”, escreveu Lula.

Outro caso ocorreu na última quinta-feira (24), quando uma operação da Polícia Militar do Rio de Janeiro, no Complexo de Israel, terminou com três inocentes mortos e outras três pessoas feridas. A ação resultou apenas na prisão de um suspeito. Centenas de motoristas e passageiros ficaram em meio ao fogo cruzado e precisaram se abrigar nas muretas que dividem as pistas da Avenida Brasil. A via expressa precisou ser interditada por cerca de duas horas.

No último domingo, um confronto entre torcedores do Palmeiras e do Cruzeiro ocorreu na rodovia Fernão Dias, na altura de Mairiporã, Grande São Paulo. A torcida do Cruzeiro estava a caminho de Minas Gerais após assistir ao jogo contra o Athletico Paranaense em Curitiba (PR). Durante a viagem, os ônibus foram parados por membros de uma torcida organizada do Palmeiras. Fogos de artifício foram lançados sobre os veículos que resultaram no incêndio de um dos ônibus. Um torcedor do Cruzeiro morreu, e outros 12 ficaram feridos.

Salário dos profissionais da segurança pública

Em meio às discussões sobre a crise na segurança pública, Lula disse recentemente ser a favor de aumento salarial aos profissionais que atuam na área. Segundo ele, “é preciso ter salário melhor, é preciso ter uma jornada de trabalha que permita o policial ser amigo do ser humano e não inimigo”.

Levantamento elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública com base em dados de 2023 apontou que 88,2% dos profissionais de segurança pública do país possuem rendimentos líquidos acima da média e abaixo do teto do funcionalismo, que é de R$ 39.293,32.

A remuneração dos servidores da área de segurança pública das três esferas obedece à fixação de padrões, estabelecidos na Constituição Federal, como a “natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira”, assim como “requisitos para investidura e peculiaridades dos cargos”.

As 27 Polícias Militares possuem basicamente duas carreiras e dez cargos/patentes. Os tenentes, primeiro posto de carreira, têm remuneração média de R$9.789,91, ao passo que um subtenente, mais alta graduação, recebe um salário de R$7.423,39. De acordo com o fórum, isso significa dizer que um praça no final da carreira vai ganhar menos que um oficial que acaba de ingressar na corporação.

No Brasil, a média salarial bruta de praças e oficiais da Polícia Militar é de R$ 8.628,87. O valor pode sofrer alteração se a análise for feita por patente, mas um coronel (R$ 20.284,12) recebe quatro vezes mais do que um soldado (R$ 4.784,85). O menor salário é o da PM do Rio Grande do Norte (R$ 4.050,88), seguido pelo Piauí (R$ 4.477,35) e Sergipe (R$ 4.898,36). O estado de Goiás aparece com a maior remuneração bruta para soldados, com valor de R$10.073,71, seguido do Distrito Federal, com valor médio de R$ 9.852,57.

Na visão do fórum, há a necessidade de se discutir a carreira antes de eventual ampliação salarial. No estudo, o órgão cita “desníveis internos significativos entre os profissionais que recebem o piso e aqueles que recebem o teto”. “A conclusão é que, de forma urgente, governos precisam repensar as estruturas de carreiras, cargos e salários. A valorização profissional pode e deve ser buscada por intermédio de ajustes mais profundos nos modelos organizacionais e na distribuição mais aderente às necessidades operacionais de cada instituição”, diz.