Presidente do Uruguai reconhece vitória de Orsi e convida sucessor da esquerda para iniciar transição imediatamente
Projeções indicam vitória da Frente Ampla sobre o candidato da coalizão de centro-direita governista, Álvaro Delgado. Resultado oficial deve ser conhecido após as 22h
O esquerdista Yamandú Orsi, da opositora Frente Ampla, foi eleito presidente do Uruguai nas eleições deste domingo, marcando a volta do poder da esquerda no país após cinco anos, apontaram as mais importantes bocas de urna do país após o encerramento da votação do segundo turno. Segundo as projeções, as distâncias entre Orsi e o candidato da coalizão de centro-direita, Álvaro Delgado, foram mínimas, de 3% a menos de 1%, conforme indicavam as pesquisas eleitorais nas últimas semanas. O resultado oficial ainda não foi divulgado pelo órgão eleitoral, mas espera-se que seja conhecido após as 22h.
Pouco depois dos primeiros números não-oficiais serem divulgados, o presidente Luis Lacalle Pou, impedido constitucionalmente de disputar a reeleição, reconheceu a derrota da direita e convidou o esquerdista a iniciar o processo de transição "imediatamente." "Liguei para Yamandú Orsi para parabenizá-lo como presidente eleito de nosso país e para me colocar sob seu comando e iniciar a transição assim que ele entender que é pertinente", disse Lacalle Pou na rede social X.
A votação começou às 8h (mesmo horário em Brasília) e encerrou às 19h30. Cerca de 89% dos aptos a votar (de um total de 2,7 milhões de eleitores) compareceram às urnas neste domingo, segundo dados do órgão eleitoral do país.
Segundo as projeções, Orsi teve 49% dos votos e Delgado 46,6%, segundo o Canal 10, com base em dados da Equipos Consultores. Para o Canal 12, que citou a pesquisa Cifra, Orsi obteve 49,5% dos votos, contra 45,9% de Delgado. Além da projeção dos principais pesquisadores uruguaios, a Frente Ampla fez a sua própria e também deu a Orsi uma vantagem de três pontos sobre o adversário.
Orsi, um professor de História de 57 anos, sucederá, em 1º de março, o presidente Luis Lacalle Pou, impedido constitucionalmente de disputar a reeleição. Ele governará o país até 2030, quando será comemorado o bicentenário da República do Uruguai.
O esquerdista, tido como sucessor do ex-presidente José "Pepe" Mujica, assumirá uma nação reconhecida como uma das democracias mais sólidas da América do Sul, com um ambiente econômico estável, que ajudou a superar desafios como a pandemia e a seca, permitindo a recuperação do crescimento do PIB, estimado em 3%.
Entre os desafios do novo presidente, porém, estão o aumento do custo de vida e a segurança pública, que preocupam a população, além da situação econômica deste de 3,4 milhões de habitantes.
O secretário-geral do Partido Comunista, Juan Castillo, declarou em entrevista coletiva que a vitória de Orsi serve para "resolver grande parte das angústias que nossa população enfrenta" relacionadas ao "trabalho" e à "melhoria da economia", assim como para "abrir o Uruguai para o resto do mundo" e atender ao "direito à educação, seguridade social, saúde, habitação, tantos direitos adiados".
— Vamos cumprir o programa de governo e o Uruguai será melhor, será feliz, será para todos e para todas — disse Castillo.
O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, parabenizou Orsi pela vitória no pleito. "Quero congratular o povo uruguaio pela realização de eleições democráticas e pacíficas e, em especial, o presidente eleito Yamandú Orsi, a Frente Ampla e meu amigo Pepe Mujica pela vitória no pleito de hoje", escreveu Lula no X. "Essa é uma vitória de toda a América Latina e do Caribe. Brasil e Uruguai seguirão trabalhando juntos no Mercosul e em outros fóruns pelo desenvolvimento justo e sustentável, pela paz e em prol da integração regional", finalizou.
Segundo turno apertado
As pesquisas já apontavam para uma disputa acirrada neste domingo. Em 27 de outubro, no primeiro turno, Orsi obteve 43,9% dos votos, muito à frente de Delgado (26,7%) — que contou no segundo turno com o apoio de todos os partidos da coalizão governista, com 47,7% dos votos no total. Orsi liderou todas as pesquisas desde então, mas foi seguido de perto por Delgado, por uma diferença que diminuiu nos últimos dias e se situou dentro das margens de erro até o último momento.
Mais cedo, os dois candidatos afirmaram que estavam abertos a negociar com o outro bloco, algo que já seria inevitável, já que nenhum deles terá maioria parlamentar. Após as eleições de outubro, a Frente Ampla ficou com 16 das 30 cadeiras no Senado, e a coalizão governante, com 49 das 99 cadeiras na Câmara dos Deputados.
Orsi disse à imprensa após votar no departamento de Canelones — onde foi intendente durante uma década — que, tendo em conta o que mostraram as últimas sondagens, já esperava que o resultado fosse equilibrado. Também assegurou ter a "governabilidade" para impulsionar "as transformações de que o país precisa".
Delgado, por sua vez, havia declarado anteriormente que queria ser "o presidente de todos os uruguaios" e adicionou que chamaria seu adversário para ingressar em seu governo caso seja eleito.
— Queremos ir ao encontro e buscar linhas de acordo — dissera o ex-secretário da Presidência de Lacalle Pou, confiando em "uma maioria silenciosa" que lhe daria a vitória porque o Uruguai está "melhor" do que em 2019.
Em 2019, a vitória de Lacalle Pou foi por 37.042 votos e o candidato da Frente Ampla não quis reconhecer a derrota até a apuração final.
'Me interessa o destino dos jovens'
A Frente Ampla já esperava voltar ao governo, perdido em 2020 após três mandatos consecutivos, um deles com Mujica (2010-2015). O ex-guerrilheiro de 89 anos, que se recupera de um câncer no esôfago, votou cedo em Montevidéu.
— Meu futuro mais próximo é o cemitério, mas me interessa o destino dos jovens, que quando tiverem a minha idade vão viver em um mundo muito diferente — disse Mujica, cercado por jornalistas, pedindo às pessoas que se preparem para "o advento da sociedade da inteligência".
Apesar da saúde frágil, Mujica teve uma participação ativa no final da campanha. Em reuniões com moradores e várias entrevistas, ele criticou a avareza de alguns políticos, as corporações e o presidente em fim de mandato Lacalle Pou. Também questionou o "consumismo abominável", e falou sobre seu legado em uma espécie de despedida que emocionou muitas pessoas.
Com AFP.
Fonte: Globo