Shein: veja como o investimento de R$ 750 milhões no Brasil vai mexer com a concorrência no varejo
Varejista digital chinesa promete nacionalizar produção de seus itens de vestuário, investir no país e gerar 100 mil postos de trabalho
Em uma reviravolta após a polêmica em torno do debate sobre combate à sonegação de plataformas digitais, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou ontem que a Shein vai produzir 85% de seus itens no Brasil, em um processo que levará quatro anos para ser implementado.
Na sequência, a varejista informou que pretende pretende investir R$ 750 milhões no país para aumentar a competitividade de fabricantes brasileiras que vão atuar como parceiras e, como antecipou a colunista do GLOBO Míriam Leitão, anunciou a criação de cem mil postos de trabalho nos próximos três anos.
A proposta é tornar o país um polo de produção têxtil. A decisão deve ter impacto na concorrência no setor de varejo. Há anos, as empresas locais se queixam de competição desleal e em condições desiguais com plataformas digitais asiáticas. O argumento é que elas se valem de subterfúgios para fugir do pagamento de impostos.
Plano de conformidade
Haddad comentou o assunto após encontro com representantes da plataforma chinesa em São Paulo, intermediado pelo presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes. A varejista também deve aderir ao Plano de Conformidade da Receita Federal.
— É muito importante para nós que eles vejam o Brasil não só como mercado consumidor, mas como uma economia de produção — afirmou o ministro, que acrescentou: — Vão aderir (ao plano de conformidade) desde que seja uma regra que valha para todos. Essa é a única contrapartida. E nós não queremos nada diferente. Queremos condições iguais para todo mundo.
Indagado se o acordo anunciado se estende a outras plataformas digitais, como Shopee e AliExpress, o ministro afirmou que o caminho está aberto e que Shopee e AliExpress já indicaram ter interesse em aderir ao plano de conformidade. Na prática, as empresas terão de pagar o imposto brasileiro na saída da mercadoria do país de origem e o preço exibido no site deve conter a tributação.
Em carta assinada pelo CEO da Shein, Yuning Liu, a empresa afirma que vai firmar parceria comercial com cerca de dois mil fabricantes brasileiros. Além disso, diz que o montante destinado a investimentos será usado para que as fabricantes têxteis possam, por meio de tecnologia e treinamento nas fábricas modernizar seus modelos de produção.
“Isso permitirá que os produtores locais gerenciem melhor os pedidos, reduzam o desperdício na fonte e diminuam o excesso de estoque, resultando em maior agilidade para atender à demanda do mercado”, diz a carta.
A previsão é que os parceiros incluam de microempreendedores individuais (MEIs) a empresas de grande porte. Elas assumiriam a tarefa de fabricar blusas, calçados, vestidos com a etiqueta da marca chinesa. As peças seriam vendidas aqui e exportadas para a América Latina.
A empresa anunciou que lançará um marketplace com vendedores terceirizados brasileiros. “O modelo de marketplace permite que os vendedores possam aproveitar ainda a vasta experiência de marketing, redes sociais logística e ecossistema de distribuição da Shein”, informou. De tudo que a empresa vende no Brasil, a China é a origem de 70% e o mercado local, de 30%.
Para Fernando Pimentel, diretor-superintente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), o investimento e a isonomia tributária são bem-vindos, mas ainda há cautela em relação à novidade.
— O Custo Brasil machuca muito. É um pais complexo, alguns bateram em retirada porque aqui é difícil para o empreendedor. Eles (Shein) vão enfrentar as mesmas regras que nós para produzir e gerar renda — afirmou.
O presidente do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), Jorge Gonçalves Filho, afirma que disputa faz parte do negócio, desde que as condições sejam as mesmas:
— Queremos igualdade de operação. Se a competição é leal, com as mesmas regras, não tem problema.
Ulysses Reis, professor de Varejo dos MBAs da FGV, avalia que a Shein terá de competir com as nacionais, mas alerta que pode acontecer o mesmo que se passou com a Forever 21, conhecida pelo preço baixo e pelo modelo fast-fashion, mas que acabou fechando as lojas.
— O preço das roupas da Shein vai subir, certamente. E o nível de competitividade vai ficar difícil. Mas a Shein tem diferenciações, como se adequar ao corpo da mulher brasileira, a capacidade de lançar coisas novas a cada duas semanas. São coleções pequenas.
A Shopee informou que 85% dos pedidos na plataforma são de vendedores brasileiros que fazem transações com compradores locais. A AliExpress não respondeu.
Fonte: Globo